Resenha da Mikaela
Eu
andava meio triste com os livros brasileiros para jovens desde O Preço
de uma Lição. E não foi com muito ânimo que comecei O Sonho de Eva, de
Chico Anes, publicado pela Novo Conceito. O livro não decepcionou, para
começo de história.
Então,
a história é sobre a Dra. Eva Abelar, pesquisadora de Sonhos Lúcidos (Quando você pode saber que está sonhando.
Dessa maneira, é possível controlar os seus sonhos e, de acordo com a
história, criar novas realidades dormindo), que recebe a notícia que sua
irmã, Anna, que trabalhava para a empresa poderosa Yume, justamente
nessa mesma área, suicidou-se. E o filho de Eva, Joachim, foi
sequestrado. Sabendo que a Yume está desenvolvendo um jogo no qual os
sonhos lúcidos são utilizados e que Joachim,
que é autista, sabia comunicar-se perfeitamente utilizando esse método,
Eva passa a achar que eles estão por trás do sequestro do garoto. Além
do mais, um indiano misterioso a alerta para o perigo. Logo, Eva passa a
participar do projeto do perigoso jogo da Yume para reencontrar seu
filho.
Chico
Anes parece ter muito conhecimento sobre o assunto que fala. Sonhos
lúcidos, um pouco de psicanálise... O livro é notavelmente escrito por
alguém inteligente e traz discussões interessantes sobre os tempos
atuais. Até onde vai o livre-arbítrio? Quanto as empresas e países
pagariam para ter acesso a ele? O DreamGame, produto da Yume, faria os
jogos virarem sonhos. Em vez de controlar um personagem no jogo, a
pessoa vivenciaria tudo em sonho, com a mesma
sensação de
realidade que teria no mundo acordado. O livro traz esse questionamentos
e quando acaba, deixa a dúvida pairar no ar sobre o futuro. É de se
pensar um pouco, após as reflexões do final.
Sobre
a história em si, o ritmo parece filme, com viagens a Viena, Brasil,
China... Tudo isso para Eva solucionar o mistério de tudo. Com relação à
protagonista, Eva, ela é um mulher muito forte, que sofreu horrores na
vida e perdeu o seu grande amor, Alec, quando engravidou
misteriosamente, o que é explicado no final do livro. Eva é ótima, mas
ao mesmo tempo, não transmite tanta empatia... Não sei explicar, ela é
corajosa e inteligente, mas algo nela (e nos personagens em geral) não
transmite a empatia que faz a leitura ficar mais eletrizante. Existem
personagens complexos, como Adhya, mas a história deles
não me pareceu suficientemente desenvolvida. Muitas coisas não foram
explicadas, como a história de Jhoti ou se Eva contou o triste segredo
de sua vida à Alec, mas pelo menos o final é fechado e se algum dia
aparecer a continuação vai ter história, mas se quiser ser um livro só,
dá pra se contentar.
Além
disso, como os sonhos são tratados na história, a própria sexualidade
acaba aparecendo também, pois os sonhos refletem os desejos das
pessoas. Mas essa sexualidade é tratada de forma muito brusca, crua, não
apenas nos sonhos, mas nas palavras dos personagens do "mal". E também
Eva é o tempo inteiro tratada como a mulher dos desejos de todo mundo
(pelo menos uns três personagens querem ter relações sexuais com ela em
sonhos, sem falar nos que ficam imaginando-a sem roupa no
decorrer da história), de modo grosseiro e nojento, até. Outras duas
personagens femininas são tratadas da mesma maneira, de forma que o
livro tem passagens mais densas por tudo isso, o que poderia ser
evitado. Tá certo que o autor quer mostrar o pensamento das pessoas, mas
acaba em excesso e as personagens femininas - com raras exceções - são
vistas de forma asquerosa, às vezes.
Fora
isso, o autor entrelaça reflexões, ação, Psicologia, lendas antigas na
história toda, entregando um livro de maior qualidade do que muitos
nacionais voltados para os jovens. Com relação à capa, achei um bom
trabalho da editora e realmente transmite o que o livro quer passar (E
demorei pra entender que tem uma mulher ali rs), além de uma
diagramação simples e boa pra
leitura. Alguns termos
podem ser melhor compreendidos se você estudou alguma coisa de
Psicologia, mas nada que interfira na história. Acho que O Sonho de Eva
pode agradar, sim, mesmo com os problemas mencionados, e, caso não
agrade, serve como reflexão para a cultura do mundo virtual que estamos
vivenciando.

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